De repente, eu vejo um carrossel… Uma roda-gigante… Um… Ah… Qualquer brinquedo desses de parque. Os melhores. Os que giram. De repente. Assim. Eu vejo.
Como posso explicar?…
Eu vejo coisas. Não com os olhos. Com todo o resto. Todos os meus sentidos e mais alguns que não posso nomear. Não posso porque não sei. Eu vejo. Só vejo. E depois tento achar as palavras. Muitas vezes não há como. Não ainda. As tais palavras não existem. Então, eu as invento. Cada vez com menos vergonha. Ou nenhuma, mesmo. As palavras surgem. Eu as vejo. Eu as uso. Bom… Usamos. Eu a elas, elas a mim. É uma dança mútua. Voltemos a isso…
Eu vejo. Coisas. E, logo, eu sei. E, logo-logo, tenho que escrever sobre elas. Como explicar isso, em imagem-palavra? Funil. Sim. Esse funil, razão de tudo na minha existência. Eu, uma funiladora. Uma tradutora, algo ineficaz, mas muito dedicada, de imagens em palavras.
Eu vejo um carrossel. Por que? Mais uma volta, damos nós…
Porque sim. A resposta me vem pronta. Eu já sei. Sei, mas não acredito lá muito. Então preciso dar a volta interrogativa. E a volta experimentadora. E a volta confirmadora. Mais uma? Sim. Por que não? A volta repetidora. A volta praticadora. Talvez, talvez, talvez uma volta demonstradora, para se converter na volta final, a volta da certeza-certíssima-absoluta donde chego ao ponto da volta depois da última volta. A volta… lembradora.
Flávia, você já sabia isso antes. Eu me chamo assim, pelo nome. Como reprimenda. Sempre. Me chamar de Flávia é naturalmente uma punição. Quando eu sou estúpida – o que é muito, muito frequente. Mas já foi mais. Feito a vergonha. E tantas outras inutilidades. As voltas vão dando jeito nisso tudo. Sim, sim. Mas… Precisava de tantas? Afinal, eu já sabia. No primeiro instante. Na primeira visão. Bem… Como posso explicar?… De volta às voltas.
Eu vejo coisas. Eu as sei. E eu soube do carrossel. Da roda. De todas essas coisas. As melhores. As que giram. Mas precisei saber que sabia, de modo que tive que enunciar a pergunta e dar as tais voltas. Quantas fossem necessárias. Parecidas entre si. Quase iguais. Completamente diferentes. Lentas, enfadonhas, tristemente silenciosas. Velozes, eletrizantes, apaixonadamente ruidosas. Eu vou girando, girando… Eu vejo.
Um carrossel. E lá vou eu, mais uma vez. De volta ao começo. O começo é onde mesmo? Em qualquer lugar. Essa é a coisa de um carrossel. Qualquer ponto é o de partida. Qualquer, o de chegada. Ou nada. Meio de estrada. Saindo de onde já não lembro, indo até o ponto que ainda não sei. Por que? Porque sim. E eu já sabia disso. Antes. Sempre. Depois. Eternamente. Sabia, mas não acreditei lá muito, de modo que precisei de mais voltas. Porque sim. Eu giro e eu giro e eu giro e eu sinto e eu sei e eu…
Vejo.
Um carrossel. Ou uma roda. Os qualquer dessas coisas. As melhores. As que giram. Em círculos, sim. Mas para frente. Para dentro. Para fora. Para tudo. Para sempre. Agora.