O Tempo do Tempo…

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Quanto tempo leva pro tempo passar? Tipo… Um ano. Quanto? Não me venha com aquele número não. Trezentos e sessenta e cinco. Isso se refere aos dias. Falo de outra coisa… Tempo. Quanto?…

Muito? Pouco? Nada? Toda a eternidade? E isso é bom ou ruim? De quais anos da vida a gente acaba lembrando mais? Tudo o que é muito bom parece ter uma velocidade enorme e o que é ruim, o contrário?… Ou não? Quando você diz “esse ano passou voando” é porque foi aquele ano sensacional da vida ou há nesse dizer, na verdade, uma sensação de desperdício, talvez?…

Eu me peguei pensando nisso nas últimas semanas… E meu embate com a questão foi se alastrando. Ele, o tempo, está em todas as coisas…

Quanto tempo leva, por exemplo, para aprender a andar de bicicleta? Para aprender qualquer coisa? Pra escrever um livro? Pra fazer um bolo? Pra se recuperar de uma indigestão? De uma desilusão? De uma… qualquer coisa? E pra botar o papo em dia com a amiga? Aliás, falando nisso… Quanto tempo leva pra uma amiga se tornar amiga? 

E, já que eu entrei (ui!) no campo dos afetos… Quanto tempo pra alguém se apaixonar? E, depois disso, quanto tempo pra perceber? Pra aceitar? Ué… Mas tem isso de “perceber”? De “aceitar”? Bom, depende. Eu aposto que pra alguém feito o Vinicius de Moraes, tinha não. Mas… Pra outras pessoas?… Oh, man! Tem sim. Se tem! Isso e outras cositas más. E depois tem… o depois! Quanto tempo pra “desamar”?… 

Voltemos ao grande Vinicius. Essa parte eu acho que ele devia saber responder também, in no time. Ou não, como diria Caetano. Vai ver ele só acumulava. Um amor on top of the other… Vai saber… Eu nunca tirei o devido tempo pra pensar em nada disso. Bom… não importa. Ao menos espero que não. Eu sempre posso abrir uma aba neste computador e procurar uma luz na sua música, na poesia… Não vai existir tempo nesse universo que me faça cansar disso.

“Eu sei que vou te amar. Por toda a minha vida, eu vou te amar.”

Vinícius, o poeta do “que seja infinito enquanto dure”, o homem de uma nova paixão a cada esquina, escreveu a sua música mais famosa usando justamente a medida de… tempo. Na maior extensão possível. Por toda a vida. Ou, num outro verso, a própria eternidade… “A eterna desventura de viver à espera de viver ao lado teu”. Quanto tempo dura isso? Não a eternidade, claro. Mas a crença nela… A crença, sobretudo, me interessa. Você já chegou a ter isso? Por um segundo sequer? Eu tive?…

Chega. Não quero mais pensar em Vinicius. O ano está acabando e o poetinha começa a me chatear. Inveja é uma boa bosta! Ele viveu, bebeu, amou, escreveu, fez insanidades, e o diabo a quatro, mil vezes melhor do que eu jamais vou conseguir. Ok…  Vá lá… Acho que consigo bater o sujeito no quesito longevidade. Um dia. Tem alguma coisa lindamente errada com a minha genética, aparentemente. Eu fico mais saudável e com muito mais energia a cada ano que passa… para frente. E mais irritada ao olhar… para trás. A estupidez da juventude “prescreve” com o tempo? Se sim, quanto tempo ainda leva?… Se eu enfiar mais tempo bem vivido nos próximos tempos, isso compensa o tempo esnobado enquanto eu não via o tempo passar?

Eu desisto da questão. Vou dormir. Esse, um tempo muito bem usado. No sono, a conversa íntima entre você e você mesmo. A liberação dos desejos ocultos. A liberação de tudo. O voo de todos os sentidos. A ruptura de todas as amarras de espaço, de lógica, de… tempo. Quanto para uma noite bem dormida? Oito horas. Que se pareçam com alguns segundos. Mas te deem a sensação da eternidade – quando feliz. E dessa vez é. Eu sonho com o poetinha. Ele bebe água. Eu, vinho do Porto. Depois, um uisquinho. Em algum momento, um espumante. Vou ficando bem doida. O poetinha, só na água, sóbrio toda a vida, achando muita graça do meu pequeno porre. Só em sonho isso seria possível. Mas quem se importa? Ele me pergunta como estou de tempo.

“Vinicius… Sei não. Não tô mais enxergando o meu relógio”. 

Ele ri. Encosta pra trás numa cadeira de balanço… Ele sabe. Do tempo. Da vida. Da arte. Do amor. De tudo. Sabe e vai me dizer. Vai dizer. Vai…

Eu acordo. Já não estou mais com Vinicius. Nem de porre. Eu enxergo o relógio perfeitamente bem. E eu lembro do sonho. Lembro, mas não entendo… Quanto tempo eu tenho, afinal? Quanto tempo eu quero? Quanto tempo é preciso? Quanto?…

Começar do Zero… Isso é Mesmo Possível?

A vida como uma folha de papel em branco. Cada erro estúpido que você já cometeu, apagado. Todas as possibilidades na sua mão como uma nova e linda caneta. Você pode apenas começar a escrever uma nova história e dessa vez vai dar tudo certo.

Reconhece a fantasia? Eu aposto que sim, porque todos nós nos deliciamos com ela, de tempos em tempos. Eu mesma provavelmente comecei ali pelos doze anos – meus amigos não se cansam de dizer quão velha eu já era desde os primeiros anos e, bom, eles têm uma certa razão!

Então, neste momento, na minha vida, tive a oportunidade de transformar a fantasia em realidade. Decidi me mudar para outro país. Me livrei de tudo o que era velho, ou quebrado, ou não exatamente do meu gosto. Cuidadosamente selecionei minhas roupas, livros e pequenos objetos favoritos. Até fiz um check-up completo com a minha médica só para ter certeza de que eu estaria virando a página totalmente saudável, nova em folha. E aí, de repente, eu me vi dentro de um avião. Dez horas depois, aqui estava eu: no meu próprio sonho de começar do zero, tornado real.

Mas eu estava mesmo partindo do zero? De fato? A sensação nunca foi completamente essa… Quer dizer, aquela sensação toda de novo país, novo apartamento, novo tudo aconteceu. Mais do que aconteceu, me atropelou – de uma maneira ótima, pelo menos pra mim, uma pessoa que adora mudanças. Mas passado esse primeiro susto, o que eu realmente encontrei no que deveria ser a minha “página em branco”? Eu mesma. Um monte de coisas novas, com certeza, mas elas estavam apenas “sentadas” no topo de, e sendo moldadas por, uma velha base que eu conheço tão bem e que atende pelo nome de Flávia Ruiz.

Eu estava subitamente mais corajosa ou extrovertida só porque ninguém por aqui me conhece mesmo e quem se importa?… Não! Eu estava livre do meu medo de altura? Ou de pássaros? Cavalos? Abelhas? Basicamente qualquer coisa que pode ser encontrada em lugares ao ar livre (sim, a lista segue e segue…)? De jeito nenhum. Que tal mais descolada ou confiante no que se refere às minhas ambições e escolhas profissionais? Oh, sim, vai sonhando!…

A questão é: eu rapidamente me encontrei lidando com as mesmas coisas da minha própria e velha maneira. Isso quer dizer que eu vou, de agora em diante, aconselhar as pessoas a não fazer mudanças? Nem de longe! Muito ao contrário. Eu apelo firmemente a todos que o façam, da forma que possam ou queiram, ou quanto antes. Porque a mudança externa é a coisa que vai sempre te olhar nos olhos e gritar na sua cara: “você não pode fugir”. Da vida, das fraquezas, de você mesma. Não pode. Na verdade, o oposto acontece.

Alguma estranha força da natureza te empurra a ser mais e mais você mesma. Às vezes, de forma intensamente dolorosa. E no exato momento em que você realiza isso, essa é a hora em que você começa a percorrer o caminho que leva para onde você queria ir em primeiro lugar, de forma bem mais instantânea, mas nem um pouco real: o caminho de escrever, não uma história, mas um capítulo novo. Porque a história começou há muito tempo. Não pode jamais ser apagada.